
Mesa de mistura à lupa – Parte 1
Last Updated on 7 Abril, 2019 by Ricardo Frade
A mesa de mistura é, normalmente, o elemento central de qualquer sistema profissional de áudio, uma vez que é responsável pela agregação dos diversos sinais de áudio e pela sua mistura. São poucos os equipamentos de áudio profissional que não estão ligados à mesa de mistura. O princípio base de uma mesa de mistura é mais ou menos óbvio – existem vários canais de áudio que podem ser parcialmente alterados individualmente (volume, equalização, etc), e que são posteriormente misturados entre si de forma a criar diversos sinais de saída.
As mesas de mistura estão divididas em duas zona: a zona dos canais e a zona do controlo geral (master). Na zona dos canais, cada coluna de botões corresponde a um canal de entrada individual, onde estão localizados os diversos parâmetros que atuam sobre esse canal em questão. Na zona de controlo geral, estão localizados os parâmetros que afetam vários canais em simultâneo ou o resultado da mistura do som.
Iremos ver que os conceitos principais das mesas de mistura se mantêm, independentemente do modelo ou do preço, variando essencialmente na qualidade do som e das funcionalidades adicionais.
Canal
Entre o momento em que o sinal entra na mesa de mistura e o momento em que é misturado com os outros canais, o sinal tem de percorrer diversos passos. Ao entrar na mesa de mistura, o sinal passa por um pré-amplificador (ganho), por um equalizador e por um controlo de volume. O sinal passa também por um bloco responsável pela panorâmica e subgrupos, e um outro bloco responsável por sinais auxiliares.
No final destes passos, os sinais são colocados em diversos buses. O bus é o nome dado ao sítio onde são misturados os diversos canais. Como iremos ver mais à frente, para além do bus left e do bus right, onde são colocados os sinais esquerdo e direito, existem muitos outros buses adicionais (subgrupo, auxiliares, etc.).
Do ponto de vista da interação com o utilizador, embora possam existir algumas diferenças de modelo para modelo, ou de fabricante para fabricante, as mesas de mistura seguem normalmente o mesmo tipo de distribuição: em cada canal da mesa de mistura encontrará inicialmente os controlos do pré-amplificador, seguido pelo equalizador, auxiliares, pan, e terminando com o fader de volume, com interruptores laterais para subgrupos.
Pré-amplificador (ganho)
Nem todos os sinais áudio têm os mesmos níveis elétricos. Um microfone tem um nível elétrico muito baixo (podendo ser inferior a 1 mV), e a saída de headphones de um sintetizador tem um nível elétrico muito maior (podendo ser superior a 2 V – cerca de 2000 vezes mais). Para que todos os canais sejam tratados de igual forma, existe o pré-amplificador, cuja função é diminuir a diferença inicial entre os níveis elétricos das diversas entradas.
Depois do pré-amplificador, todos os canais terão a mesma gama de valores, e podem ser tratados como iguais, independentemente do seu nível de entrada. Para isso, existe um potenciómetro de ganho, que indica a amplificação inicial (ou eventual atenuação) necessária para o sinal de entrada. Como este andar é o primeiro que o sinal encontra, podem existir opções adicionais relativas à entrada do sinal.
Dynamics/Delay
As mesas analógicas topo de gama e as mesas digitais incluem, logo a seguir ao andar de ganho, um andar para processamento dinâmico e/ou delay. Esses processadores dinâmicos podem funcionar como gates, compressores, limitadores ou expanders. Podem também incluir uma unidade de delay que pode ser usada para atrasar o som (por exemplo, para compensar atrasos existentes noutros canais).
EQ
Equalização é o processo de atenuar (cut) ou amplificar (boost) algumas gamas de frequências. Na maior parte dos casos, a equalização é utilizada para corrigir determinados problemas. Um microfone que não tem uma resposta em frequência linear (captando umas frequências melhores do que outras) ou uma sala com determinadas ressonâncias, são alguns exemplos de situações que podem ser parcialmente corrigidas com a utilização de um equalizador. No entanto, a equalização também pode ser usada de forma criativa.
Por exemplo, cortar agudos a um baixo elétrico para obter um som mais acústico ou fretless(nome dado aos baixos que não têm trastes ao longo do baixo). Existem 3 tipos de equalizadores: normais, semiparamétricos e paramétricos. Os equalizadores normais apenas permitem ao utilizador aumentar ou diminuir a intensidade de determinadas bandas de frequência predefinidas.
Nos equalizadores semiparamétricos, passa a existir um controlo adicional – frequência – ou seja, para alem de podermos indicar o nível a aplicar pelo equalizador (atenuar ou amplificar), podemos variar ligeiramente a gama de frequências em que isso acontece. Os equalizadores paramétricos têm uma terceira funcionalidade – o Q (largura de banda) – que podemos usar para indicar se queremos que o equalizador seja aplicado a uma gama larga ou estreita de frequências.
Auxiliares
Os auxiliares, como o nome indica, são saidas auxiliares para quando se pretende criar ‘misturas’ adicionais, além da mistura final da mesa. Duas das utilizações mais correntes dos auxiliares está relacionada com a utilização de efeitos e com a monição de palco. Imagine que quer adicionar reverb (reverberação) a alguns canais da mesa de mistura. Se fosse para adicionar reverb a todos os canais, bastaria colocar o reverb no final da mistura.
No entanto, para se poder definir em cada canal a quantidade de reverb desejada, temos de recorrer aos ‘auxiliares’. Desta forma, é criada uma mistura que será colocada externamente na unidade de reverb, e cujo processamento será adicionado à mistura geral. Se um canal não estiver presente nessa mistura, não terá reverb. Se estiver presente com um nível maior, terá maior quantidade de reverb. Resumindo, o nível do auxiliar irá definir a quantidade de efeito pretendido.
Uma outra utilização frequente dos auxiliares é a monição. Quando se pretende uma monição no palco (colocação de colunas no palco, para que os músicos possam ouvir-se uns aos outros), o som aí colocado não é igual ao som que irá sair das colunas principais do concerto. Por exemplo, se a sala for grande, o som da bateria terá de ser colocado nas colunas principais; no entanto, como os músicos em palco já ouvem a bateria mesmo ao lado, esta não precisa de estar na monição (ou estará com um volume inferior).
O mesmo se passa com o som dos 4 amplificadores de guitarra do guitarrista principal – neste caso, quem é que precisa de monição para ouvir o som da guitarra elétrica? Em compensação, a voz do vocalista terá de ser bem ouvida por todos. Os auxiliares permitem então criar uma nova mistura, independente da mistura geral, especificamente para a monição – canal a canal, indicamos que nível é que queremos na monição de palco. Os auxiliares ainda podem ser usados com outros objetivos – são um género de ‘canivete suíço’ da mesa de mistura.
Um aspeto muito importante a ter em conta na configuração dos auxiliares é a escolha entre a opção pré e a opção post, indicando se o som do auxiliar é obtido antes (pré) ou depois (post) do controlo de volume, ou seja, se queremos que o volume do canal influencie (Post) ou não (Pré) o auxiliar. No caso da monição, não queremos que influencie – o facto de alguém aumentar o som geral da bateria não deve aumentar o som da bateria na monição, uma vez que queremos uma mistura independente so som geral – por isso opta-se pela opção Pre.
No caso dos efeitos (por exemplo reverb) queremos que seja dependente, e por isso escolhemos a opção Post. Se diminuirmos o nível de um canal, queremos que o nível do reverb desse canal também diminua; ou se alguém desligar completamente o volume de um canal, não queremos que se continue a ouvir o reverb criado por esse canal. Nas mesas de mistura de melhor qualidade, a opção Pre/Post existe na forma de interruptor. Nas restantes, é a própria mesa que define de forma fixa que determinados auxiliares são sempre Post ou Pre. Algumas mesas de mistura deste tipo permitem que essas configurações possam ser alteradas internamente, através do corte ou da soldadura de determinados pinos nas placas eletrónicas.
Insert
Há situações em que é necessário, a meio do percurso da mesa de mistura, efetuar algum processamento adicional. Por exemplo, aplicar um compressor ou usar um equalizador externo mais completo. O insert permite que o sinal de um canal seja desviado para o exterior, e que depois de tratado, volte novamente a entrar no canal de forma a continuar o seu caminho interno dentro da mesa. Para isso é usado um cabo “y” (bifurcado), com um conector jack TRS, que envia e recebe o sinal em questão. A sua introdução na ficha insert do canal interrompe o caminho normal dentro da mesa, desviando o sinal para fora e novamente para dentro. Em estúdio, o insert também pode ser usado para ligação e gravadores multi pista.
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